Como trabalho principalmente com mulheres surgem conversas de muitas áreas e percebi que dentro da da maternidade ainda há muitos tabus.
Tabus sobre as mulheres que não querem ser mães; sobre as mulheres que querem ser mães solteiras e recorrem à inseminação artificial; sobre as mulheres que detestam o seu corpo quando estão grávidas; sobre as mulheres que não gostam de estar grávidas; sobre mulheres que estão num relacionamento onde o companheiro já tem filhos, sobre as mulheres que perdem os seus bebés...
Sobre estas últimas são tantas as histórias que resolvi partilhar uma parte da minha, porque afinal também me incluo nelas.
Quando é que a mulher se torna mãe?
O que faz de uma mulher uma mãe?
Ao contrário do que muitas vezes se lê, uma mãe não nasce quando pega no seu bebé pela primeira vez depois do parto, porque há muitas mulheres que adoptam e não passam por essa experiência, enquanto que há mulheres que a têm e depois rejeitam os seus filhos. Há também aquelas que se sentem infelizes e frustadas com a sua vida e que usam os filhos como arma para ferir o pai, ignorando qualquer malefício que possam provocar na saúde emocional das crianças.
Ser mãe é um conjunto de características e emoções que vão muito para além da palavra ‘mãe’. Ser mãe é altruísmo. É um abdicar tão forte do ‘eu’ que deixa de haver espaço para egoísmos. Ser mãe é responsabilidade. Tudo passa a ser feito em função daquele ser tão puro, um diamante em bruto que vai ser lapidado com os valores e princípios que lhe incutirmos. Ser mãe é protecção e amor. É sentir pela primeira vez o que significa a palavra medo.
Mas ser mãe também é ter momentos de frustração, desespero e raiva, que surgem pela privação de sono, pelo não saber lidar com emoções, as suas e as da criança, pela insegurança e dúvida de saber se se está a fazer o certo.
É aqui que te digo que, ao contrário do que ouves, não existe o certo ou o ideal. Só tens que te guiar pela intuição e acreditar que a natureza sabe sempre o que faz.
Onde a minha história se encaixa nisto?
Porque faço parte do grupo de mulheres que acolhe os filhos do companheiro, e que sim, é uma posição ingrata porque não pretendemos ocupar o lugar da mãe, mas ao mesmo tempo temos a responsabilidade de dar um bom exemplo e incutir valores, já que as crianças passam a estar na nossa casa, e integrar-se na nossa rotina e família.
É amar alguém que não é nosso mas que de certa forma nos pertence e faz parte da nossa vida. Não, não é fácil, mas quando é feito com verdade a vida mostra-nos o caminho e torna-se muito gratificante.
Depois, também faço parte do grupo de mulheres que perdem os seus bebés.
Nunca planeei ser mãe, mas a vida decidiu surpreender-me. Engravidei, e tal como a minha mãe passou comigo, a minha gravidez era de risco. Tentei cumprir todas as recomendações médicas e levei-a até onde foi humanamente possível, ficando deitada por muitas semanas numa cama em casa e depois no hospital.
Quando entrei no quinto mês uma infecção fez com que começasse a perder o líquido amniótico e os médicos disseram-me que tinha que interromper a gravidez. Doeu ouvir, mais ainda sabendo que o meu bebé estava saudável. Foi muito difícil tomar a decisão. Foi difícil engolir aquele comprimido que ia parar o seu coração, e foi igualmente difícil passar pela dor de fazer um parto vaginal e não poder ter o bebé nos braços, o meu Gabriel. Mas foi ainda mais difícil olhar para o espelho no dia seguinte ao parto e já só ver um novamente.
Fica um vazio.
Foi um período muito emotivo da minha vida. Chorei, contestei, orei, mas também sorri imenso, porque me senti abençoada por aquele breve momento em que uma alma me escolheu para mudar a minha vida.
Como as pessoas não sabem como agir contigo, a frase que mais diziam para confortar é um ‘não tinha que ser’, acompanhado de um encolher de ombros e um meio sorriso, mas para mim ‘foi mesmo assim que teve que ser’.
Perdas gestacionais são mais comuns do que se imagina. Há estatísticas que apontam para 3 perdas em cada 10 gestações, só que poucas mulheres falam disso, por vergonha, por culpa, mas sobretudo porque vem associado a muita dor emocional. Estas perdas podem acontecer por diversos fatores, infecções como o meu caso, malformações congénitas, morte espontânea em gravidezes avançadas sem qualquer explicação.
É também frequente mulheres nem saberem que perderam os seus bebés, porque estão numa fase tão inicial que a perda se confunde com a menstruação, principalmente se a mulher tiver o seu ciclo irregular. Não é culpa da mulher, maioritariamente estas perdas acontecem por malformações e a natureza age naturalmente.
Por isso é tão importante falarmos deste assunto, mostrar a outras mulheres que não estão sozinhas, que podem e devem falar sobre o que experienciaram e sentem.
Queria só transmitir-te que independente do que escolhes para ti, ou do que acontece na tua vida, não és menos mulher, não és menos mãe, e não estás sozinha. Se alguém te fizer sentir o contrário, lembra-te que essas palavras dizem muito mais sobre a pessoa que as faz do que sobre ti.
Confia.
Com amor,
Ana